terça-feira, 12 de junho de 2012

O Dependente Onírico


Ele estava preso no mesmo endereço de sonhos e fadiga.
Tudo rodava - chão, colcha, travesseiro e colchão.
Girava de antemão. Abria as janelas e fitava o céu do dia-a-dia
Para fechá-las, em desinteresse, em ofuscação solar...
...Logo em seguida o horizonte vira um pequeno vão.

Como num vício, numa decepção.
O navegador de águas profundas observa na janela fechada ocular
Os horizontes que tomam formas diferentes a cada movimento,
A cada guinada acolchoada, a cada espasmo macio...

- Não quero estar no pano deste plano,
Nem colocar os olhos pra fora da expressão.
Coloco os olhos pra dentro dessa fora-dimensão
Aonde tudo que há para se fitar são ondas de um exílio

Os buracos de luz queimavam as paredes,
Os olhos se escondiam, a tontura ecoava.
Eram gritos líricos-oníricos clamando de saudade,
Jogando baldes d’água,
Tentando apagar o quarto que incendiava.

Estava em negação, inerte num ócio digno.
Perdido nas cores de um oceano florido,
Encontrou aquilo que desejava.
Um útero divino se formava,
Sua placenta era composta de memórias distorcidas
E desejos remoídos.

Estava aonde desejava estar
E nem sequer lembrava como havia chegado.
Quando de súbito tudo despencara.
O relógio gritou:
- É hora de viver! É hora de viver!!!

O Dependente Onírico de súbito levantou.
E sua abstinência gritou e, ironicamente,
Como uma overdose,
De súbito enfiou dois punhais em seus olhos
E o matou.

A Bronquite e As Bitucas


Joga o cigarro e apaga com o sapato
O último trago deixa sua boca.
Seus dentes mordem os lábios,
O olhar é voraz,
O peito sibila, chia, queima e palpita.
O raspar sobe sua garganta...

Olhou para a bituca no chão,
Pisou com o rancor de um perdedor obstinado,
Transformou-o em um pedaço distorcido de nada.

O Sol batia forte nas pupilas dilatadas,
E brotou, como no surreal de um sonho, ao seu lado
Uma lata.
Uma lata de lixo reciclável.

Ele fitou a lata de lixo
E a bituca com seus olhos fixos em chamas
E disse:
“Bitucas não são recicláveis”
E abriu mais um maço
E acendeu mais um cigarro...
E jogou o cigarro, e o apagou com os sapatos...